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Foto do escritorPaulo Fabre

Minha pergunta de U$1Milhão

Paulo Fabre - Acervo

“Por que temos que crescer?” — bufou minha filha mais velha, entrando no carro para ir à escola.“Essa é uma pergunta de 1 milhão de dólares”, respondi, explicando o conceito por trás da expressão e emendei: “Todos temos uma”.“E qual é a sua, papai?” — perguntou curiosa.“A minha é: ‘Por que complicamos tanto a vida?’” — respondi.

A sabedoria infantil mudou o assunto, evitando entrar num círculo filosófico que a curta distância entre nossa casa e a escola não daria conta de sustentar. Mas a pergunta já ressoava no infinito da minha mente, buscando mais o alívio da resposta do que o suposto prêmio.

Há alguns anos, penso nisso de alguma forma. Às vezes, me questiono se não estou apenas reclamando da vida adulta ao apreciar à distância a doce nostalgia dos tempos da infância. Mas acaba vencendo a afirmação de que a vida é mesmo mais complicada do que a de meus pais e avós, mesmo sem eles terem tido acesso às tantas facilidades que temos hoje. Que belo disfarce esse! Descubro em minhas elucubrações. Nem o mais sagaz dos lobos, na mais fina das peles de cordeiro, conseguiria ir tão longe.

Evito deixar o peso da pergunta afundar em meus pensamentos enquanto lavo a louça ou varro a cozinha. Apoio-me na literatura, elaborando uma resposta própria e convincente.

Quando Sidarta, personagem de Hermann Hesse, encontra-se com Sidarta (Gautama), o Buda original o convida a segui-lo entre seus discípulos. O primeiro educadamente recusa o convite do mestre, alegando que a experiência da iluminação é um caminho individual que não pode ser ensinado.Encontro no Oriente uma luz mais clara, enquanto me desapego do iluminismo cartesiano e sua insistência em explicar tudo. Aliás, como diria Antônio Bispo, a visão eurocristã arrancou a humanidade da natureza, colocando cada ser numa caixinha separada, nomeando e precificando o que não é humano como recurso, quando, de fato, tudo é uma coisa só — seja o “Tao da Física” ou o vazio do Zen. E foi justamente lendo a oralidade dos povos da Terra, traduzida em palavras por Antônio Bispo, que encontrei o contorno que faltava para a minha resposta.

Agora, espero ansiosamente um Pix de 6 dígitos cair na minha conta.

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